J.R.R. TOLKIEN: UMA ANÁLISE SOBRE A CULTURA POLÍTICA CONSERVADORA INGLESA

Mara Lúcia Ribeiro de Sousa
Aluna do Programa de Mestrado da Faculdade de
Ciências Humanas e Sociais. UNESP, Franca. 
Orientação: Profa. Dra. Teresa Malatian

Resumo:

A apresentação procura compreender o papel de J.R.R. Tolkien como intelectual representante da cultura conservadora do início do século XX, através da análise de cartas e da biografia do intelectual; organizando um estudo das redes de socialização que pautaram a sua vida e que revelam uma visão de mundo partilhada por outros intelectuais.

Palavras-chave: Tolkien. Conservadorismo. Cultura Política. História
Intelectual.



Comentários

  1. Professora, parabéns pelo texto.

    Gostaria de saber, considerando o cenário cultural inglês e Tolkien com suas produções escritas ou práticas na sua vida, se em sua pesquisa consegue perceber alguma crítica à Modernidade dentro dessa "cultura política conservadora". E, para além disso, uma forma de perceber a Natureza relacionada com essa crítica à Modernidade, caso existente.

    Desde já agradeço pela resposta.


    Wendell P. Machado Cordovil

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    1. Olá, Wendell. Excelente pergunta!

      O conservadorismo clássico, a qual Tolkien é herdeiro, é um crítico da modernidade industrial, principalmente porque a aristocracia inglesa e o ideal de vida campestre perdiam força para o avanço da indústria e das cidades (é curioso observar que essa mesma aristocracia soube se adaptar às mudanças e não "caiu" como a aristocracia francesa). O que os conservadores daquele período (e alguns até hoje seguem com esse debate, principalmente Roger Scruton) é que a modernidade destrói a Natureza, que nada mais é que uma criação de Deus. Tolkien defende essa mesma ideia em seus livros e também em práticas cotidianas (um exemplo simples era o fato dele não dirigir porque acreditava que os carros eram barulhentos e responsáveis por destruir a natureza).

      Apesar de sempre fugir de debates políticos e negar qualquer tipo de relação de seus livros com eventos políticos contemporâneos, Tolkien era um homem fruto do seu tempo e a via a modernidade como destrutiva. Uma das influências de Tolkien era o intelectual cristão G.K. Chesterton, um crítico da industrialização, homem admirado pelos conservadores e que via a queda do homem após o avanço da modernidade industrial. Para Tolkien, o homem moderno (com suas máquinas, a destruição da Natureza e também suas práticas modernas) se aproximava mais do mal (referência a Queda do homem do cristianismo), sendo portador de um pecado que o afastava da pureza e de Deus. Outro exemplo era seu desprezo pela literatura da época e até dos dândis do final do século XIX, que ele achava vulgar.

      Um contraponto a essa visão é que existem autores, como Jane Chance e o pesquisador da UNESP, Aparecido Rossi, que argumentam que mesmo ao criticar a modernidade, Tolkien acabou fazendo parte dela, principalmente ao pensarmos que ele se afastou de padrões literários da época e foi responsável por desenvolver o que chamamos de romance de fantasia épica.
      Espero ter respondido sua pergunta.

      Obrigada e sinta-se a vontade para o debate!

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    2. Muito interessante. Acredito que realmente é possível ver essa questão, no que diz respeito a Tolkien, no segundo livro de O Senhor dos Anéis (As duas torres). A destruição das florestas de com máquinas para a chegada de uma "modernidade" de guerra - controlada pelo mago Saruman - que chega a fazer a própria Natureza reagir com destruição (os Ents).

      Obrigado pela bela resposta e parabéns pelo texto.

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  2. As obras fantásticas de J.R.R. Tolkien de fato exprimem esse conservadorismo discutido no seu texto, e chamo atenção para citação de Edmund Burke: “nós tememos a Deus, olhamos com a admiração para os reis, (...) com reverência para os sacerdotes, e com respeito à nobreza.” (2017, p. 139). As obras o Senhor dos Anéis, o Hobbit, e os escritos post mortem, de tal modo abordam essa veneração pelos reis e líderes da Terra Média, principalmente quando somos apresentadas as três raças: os homens, os elfos e os anões, possuidores dos anéis e reinos no mundo de Arda, e arautos da esperança em um mundo tomado pelo Senhor do Escuro. Partindo disso, (1) você considera que a queda das monarquias iniciada no século XVII e XVIII, continuadas no XIX e século XX, decorrente das revoluções burguesas, guerras e os ideais iluministas, se relacionam direto com os escritos do autor? (2) O fato de o homem deixar de ser temente ao rei como representação de Deus na terra, e a perda da fé no sobrenatural foram determinantes para que Tolkien trouxesse essa representação para as suas obras?

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    1. Obrigada pela pergunta, Pedro Antonio.
      1) Tolkien evitava comentar política e tinha uma opinião bem "complexa" sobre a democracia. Se via como um homem monarquista, pois acreditava que apenas um líder centralizador e que não quisesse ser escolhido e amado pelo povo podia governar, mas, ao mesmo tempo, admirava as obras do socialista William Morris. De qualquer forma, seus escritos são superficiais a respeito das quedas das monarquias do final do século XVII. Na minha pesquisa, percebo que as revoluções burguesas e o avanço do capitalismo industrial foram determinantes para sua concepção de mundo pautada na ideia de que o homem destruiria a criação divina. Tolkien, assim como muitos conservadores do final do século XIX, era um crítico às reformas liberais realizadas pelo ministro Gladstone (e que diminuíram com os campos e florestas da Inglaterra para dar espaço à agricultura já com máquinas). Já sobre o Iluminismo, Tolkien não tece comentários (Sabemos que era um defensor da liberdade, pois escreveu muitas cartas contra o totalitarismo de Hitler e Stalin e sobre a igualdade, como o conservador que era, acreditava que cada ser humano ocupava um lugar na sociedade, subalterno ou privilegiado, e que as pessoas deveriam respeitar essas posições).
      2) Como dito acima, em uma das cartas de Tolkien (carta n.52), ele afirma que o monarca era o mais próximo de um bom governante, pois não havia sido escolhido por seus súditos, sendo uma representação de Deus que não desejava o poder por si só; porém ele nunca deixou nítida suas opiniões políticas e muito menos confirmou qualquer relação com política na sua obra. Acredito que seus textos trazem muito da Queda, pois Valinor seria o mais próximo de uma representação do Céu, e o mundo dos homens (a Terra Média) seria o local em que a fé, a pureza e o sobrenatural estariam morrendo.
      Espero ter respondido suas perguntas.
      Muito obrigada por ler e comentar.

      Mara L. R. de Sousa.

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  3. Fabiana Eulalia de Queiroz

    Olá, Mara Lúcia

    Parabéns pelo trabalho. Gostaria de saber se ao ler as principais obras de Tolkien você pôde perceber traços desse conservadorismo de Tolkien na construção dos personagens e no desenvolvimento das histórias e se poderia citar alguns exemplos.

    Muito obrigada pela resposta.

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    1. Olá, Fabiana! Obrigada pela pergunta!
      Um dos valores conservadores marcantes na narrativa de Tolkien é a valorização da tradição, como o fato dos elfos serem os portadores da razão na Terra Média e fonte de conhecimento, assim como os descendentes de Númenor serem os únicos com honra e dignidade para serem reis dos humanos.

      A ideia dos elfos representarem a pureza que os humanos e anões nunca tiveram retoma também o traço conservador do respeito à religião e moral, pois os elfos representam Adão e Eva antes da queda.

      Uma curiosidade é que os Hobbits foram criados tendo em mente, segundo Tolkien, típicos ingleses (como ele próprio): são resistentes, conservam suas tradições e não gostam de se envolver em "brigas" fora de seu território. Então, talvez, se fossem para falar de traços conservadores marcantes em personagens da sua obra, eu diria os Hobbits. Por exemplo, Sam era o jardineiro de Frodo e foi escrito pensando em um personagem subalterno que honraria com seu mestre, sabendo que era inferior a ele.

      Fora isso, Tolkien não colocou elementos conservadores marcantes e nem "pregou" em seus livros como o amigo C.S. Lewis. Aliás, esse é o motivo de muitos falarem que a obra de Tolkien consegue agradar tanto cristãos e conservadores (ele é admirado até hoje em universidades católicas dos EUA e fonte citada frequentemente em sites conservadores), como jovens da contracultura (que foram os que realmente divulgaram a sua obra na década de 1960, já nos Estados Unidos).
      Muito obrigada novamente!
      Mara L. Sousa.

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